“ Luanda – O secretário-geral da União dos Escritores Angolanos (UEA), Carmo Neto, apontou, em entrevista exclusiva à Angop, o talento, leitura e a criatividade como elementos essenciais para quem quer entrar no mundo das letras.
É verdade que o livro deveria ser mais barato, por exemplo, que a cerveja, mas existem condicionantes que fazem com que seja vendido a um preço um pouco mais elevado. As famílias também jogam um papel fundamental neste processo, as creches, as escolas, os professores. Felizmente a lei da promoção do livro e da leitura acolhe todas estas situações de facto.
Para corrigir a juventude, temos antes que ver as causas. É preciso que os sociólogos possam ter a oportunidade de pronunciamento sobre a matéria, até porque são parceiros do Estado na realização de determinados programas, tendo em conta que o foco de estudo deles é a sociedade, como se movimenta e as razões disto ocorrer. Queremos corrigir a juventude, devemos saber primeiro quantas bibliotecas existem em Luanda, por exemplo. Quantas livrarias existem em cada município?
Não devemos olhar só para o Estado como o principal responsável por esta situação, já que o processo educativo de uma criança começa em casa. Portanto, a família tem uma quota parte de responsabilidade nesta tarefa. É necessário vincular a família nesta acção. O papel da família é também o dever de cuidar, de orientação do comportamento. O que melhor deve fazer. As famílias não devem pensar somente que o importante é a criança ler o catecismo, o que o catequista faz é bom, é orientação religiosa, mas também é necessário catequisar o filho para a leitura. São estes papéis que devem ter alicerces para serem fomentados.
Agora vemos jovens que até na sua obra escrita têm talento, têm criatividade, mas não têm domínio na escrita. Algo falhou na formação da personalidade de jovens nestas condições.
Com o escritor Boaventura Cardoso, que teve a ideia sobre o encontro nacional de escritores que estamos a institucionalizar, procuramos beber dele informações que nos ajudam a melhor conduzir os vários processos que temos. Há um diálogo com os membros da UEA que satisfazem a actual direcção.
O bom relacionamento entre a velha e nova geração de escritores e a actual direcção da UEA é tão satisfatória que tem havido um diálogo franco e construtivo, que leva a que se ventile a hipótese de se institucionalizar o prémio literário Uahenga Xitu, dar-se o nome de António de Assis Júnior à livraria da UEA. Fruto deste diálogo está também em estudo a hipótese de se institucionalizar o grande prémio UEA, com uma periodicidade bianual, com um valor de 50 mil dólares para o vencedor. A ideia é que os concorrentes tenham obras editadas pela UEA. Estou em crer que um dia a ideia será concretizada.
Já sentamos com o escritor Pepetela com quem abordamos outros projectos que vamos amadurecer. Há um diálogo permanente estabelecido com os mais velhos, como por exemplo o Fragata de Morais, entre outros, que têm acolhido de bom agrado as ideias da nova geração e acrescem outras para o bem da nossa organização.
O prémio literário Quem Me Dera Ser Onda agora é nacional. Queremos com isto dizer que estabelecemos um vínculo de parceria com o Ministério da Educação, que leva os professores e coordenadores da disciplina de língua a promover e divulgar o regulamento do concurso literário nas mais recônditas escolas do país. E assim todos os estudantes interessados da faixa etária regulamentada, dos 13 aos 17 anos de idade participam.
Em termos de publicações, temos em agenda várias obras em parceria com a Leya (Texto Editores). Os lançamentos acontecerão entre Angola e Portugal e noutros países de língua oficial portuguesa. Estamos também a tratar da reedição de livros, cujos conteúdos preenchem os programas. Refiro-me a obras de Luandino Vieira, Óscar Ribas, António Jacinto, José Luís Mendonça, João Maiomona, Fragata de Morais, entre outros autores, que preencherão cerca de 40 títulos, no âmbito das reedições. É um projecto que está a ser realizado em parceria com a editora Letras. Brevemente sairão a público, tendo em consideração o início do ano lectivo.
Relativamente à promoção da literatura e dos escritores angolanos no exterior, a UEA tem apostado forte também no processo de tradução da literatura angolana em outras línguas, nomeadamente italiano, francês, inglês e alemão, árabe, espanhol, cujas antologias também em português serão encaminhadas para o Instituto de Literatura Universal, através da Faculdade de Letras da UAN. Temos agendada uma mesa internacional de literatura angolana. Estamos muito avançados no que diz respeito aos actos preliminares. Temos ainda em agenda inauguração da nossa livraria. Em resumo, vamos bem. Satisfaz as pretensões da actual direcção da UEA.
A título de exemplo, devo dizer que, dentro de dias, receberemos cinco títulos infantis, nomeadamente da escritora Cremilda Lima, e três dos primeiros classificados do concurso literário Quem Me Dera Ser Onda. E teremos ainda o livro do vencedor do Prémio Sonangol de Literatura, bem como os livros da Colecção destinados ao sistema de ensino (10 títulos) e outros 10 que estão a chegar do Brasil. A actividade é, de facto, fluente, é activa e representativa, mas também esta interacção tem fundamentação. Nos últimos tempos, vendem bem os livros editados pela UEA. A par destas acções, a UEA tem também sabido proteger os seus membros, prestando os apoios necessários em questões de saúde, direitos de autor, sala para o lançamento das suas obras, entre outras.
A UEA assume um conjunto de responsabilidades que lhe permitem granjear respeito e prestígio por meio da sua contribuição na regulação da qualidade da produção literária. Supõe-se que ali onde a UEA coloca o seu selo cultural existe não apenas qualidade, mas acima de tudo prestígio. Entretanto, porque o mundo da literatura não se regula com fronteiras físicas entre o estético e o não estético; literário e o não literário, tanto podemos estar a pecar por defeito ao não apoiar certas produções, como podemos estar a pecar por excesso ao apadrinhar obras julgadas literárias. Portanto, para nós, a literatura é ainda uma manifestação artística, cuja matéria-prima é a palavra.